domingo, maio 22, 2005


CULTURA

IMAGINE UMA SURPRESA


Longe de imaginar onde poderia eu chegar graças a uma gentilieza de uma habitual correspondente, a Odiza, que teve a feliz ideia de me enviar uma poesia caipira de autor desconhecido que é uma verdadeira PÉROLA. Uma joia rara que, sem eu imaginar, me deliciou e encantou. Buscando respostas certas cheguei onde desejo que você (que me lê neste momento) também chegue. Ao cerne genial de um dialeto maravilhoso, com origens inquestionáveis e que se nos colocam perante interrogações que permitem encontrar a razão para muitas coisas belas. Mas antes entenda, parcialmente, a minha mensagem buscando no texto abaixo uma ideia precisa e importante para que a poesia que a seguir posto seja entendida no seu verdadeiro contexto.

Uma língua rica, um sotaque próprio. Quem disse que o caipira fala errado? O dialeto do caipira é muito próximo do português que se falava no Brasil e no Portugal antigos. Você já notou que o caipira diz "ansim" e não assim? Esta é a forma usada também nas peças de Gil Vicente. Geralmente o caipira coloca o verbo no plural: "a cabocrada tão fazendo festa"; "aquela gente são bão". Mas Camões fez o mesmo: "Se esta gente que busca outro hemisfério ( ) não queres que padeçam vitupério". Nesse caso, qualquer semelhança não é mera coincidência.

POESIA CAIPIRA


Vô contá como é triste, vê a veíce chegá,
vê os cabêlo caíno, vê as vista encurtá.
Vê as perna trumbicano, com priguiça de andá.
Vê "aquilo" esmoreceno, sem força prá levantá.

As carne vão sumino, vai parecêno as vêia.
As vista diminuíno e cresceno a sombrancêia.
As oiça vão encurtano, vão aumentano as orêia.
Os ôvo dipindurano e diminuíno a pêia.

A veíce é uma doença que dá em todo cristão:
dói os braço, dói as perna, dói os dedo, dói a mão.
Dói o figo e a barriga, dói o rim, dói o pulmão.
Dói o fim do espinhaço, dói a corda do cunhão.

Quando a gente fica véio, tudo no mundo acontece:
vai passano pelas rua e as menina se oferece.
A gente óia tudo, benza Deus e agradece,
correno ligeiro prá casa, voltando do INSS.

No tempo que eu era moço, o sol prá mim briava
Eu tinha mil namorada, tudo de bão me sobrava.
As menina mais bonita, da cidade eu bolinava.
Eu fazia todo dia, chega o bichim desbotava.

Mas tudo isso passô, faz tempo ficô prá tráis
as coisa que eu fazia, hoje num sô capaiz.
O tempo me robô tudo, de uma maneira sagaiz.
Prá falá mesmo a verdade, nem trepá eu trepo mais.

Quando chega os setenta, tudo no mundo embaraça.
Pega a muié, vai pra cama, aparpa, beija e abraça,
porém só faz duas coisa: sorta peido e acha graça!

A título de ajuda para os visitantes cuja cultura caipira possa despertar atenção ou curiosidade aconselhamos um salto ao DICIONÁRIO CAIPIRA e delicie-se com o que nunca imaginou ser uma realidade deste nosso mundo.