sexta-feira, agosto 25, 2006

HUAMBO, CIDADE, VIDA!

ANTES E DEPOIS
DO 24 DE ABRIL

É em momentos de tristeza que se encontra a verdadeira força interior que comanda nossos actos, espontâneos e sinceros. Aqueles outros, os que nos permitem meios de os evitar, são o pão-nosso-de-cada dia. Deixemo-los para as conversas de café.
É isto que eu enfrento neste momento em que pretendo evocar as recordações de uma época marcante, por mim vivida no Huambo (Nova Lisboa), particularmente num espaço de tempo em que conheci e trabalhei com o António Filipe, falecido esta semana num acidente de viação, em Benguela: 1974. O 25 de Abril, só foi confirmado em Angola, alguns dias depois, embora me tivésse apercebido da revolução, em Portugal, através de familiares que viviam o momento lisboeta. Na ocasião desempenhava funções na Emissora Oficial de Angola (EOA) como delegado em Nova Lisboa (Huambo), e no jornal O PLANALTO, como editor. Nessa ocasião o Filipe era técnico no Rádio Clube de Benguela. A efervescência revolucionária gerou euforias em Angola, dando lugar a sonhos de ambição de poder na perspectiva de uma Angola independente. Mas isto são outras estórias que um dia penso aqui contar...
Sem ambições mas recheado de felicidade pela visão de uma Angola independente - desejada desde longos anos mantive-me nas minhas funções e desde logo prevendo o que era lógico como futuro numa rádio sem censuras, estabeleci contactos com Luanda, para não ser apanhado por nenhuma surpresa.
Foi um ano cheio de situações jamais adivinhadas. Governos de transição. Traições. Promessas vãs. Ameças. Glória. Tentativas de subornos e até ameaças de morte eu suportei. Não alinhado à UNITA numa região preponderante e facultativa a Jonas Savimbi, era de esperar que iria sofrer pressões dada a minha isenção, uma vez interpretadacomo partidário do MPLA, a partir do dia em que me neguei a fazer uma entrevista a Nzau Puna (um dos históricos das Forças Armadas da Unita FALA) no decorrer de uma conferência de imprensa em que a UNITA simulava a apresentação de armas de fabrico soviético. A notícia foi dada com a verdade dos acontecimentos sem os pormenores que a UNITA pretendia. Claro... a sentença foi dada e só não foi cumprida porque a tempo e horas, com a ajuda de meu amigo Fernando Silva (Poço da Morte) e de meus cunhados Faceira Torres e JoséTirso, consegui juntamente com minha mulher e filhas refugiar-me em Luanda. Aconteceu um vioo milagroso da TAP que aproveite.
Foi já em Luanda que conheci o Filipe. Um jovem alto (1m80), cabelos aloirados e de olhos azuis sempre sorridente de voz timbrada acima dos 15 decibéis, falando de técnica como eu falava de futebol. Até Novembro de 1975, conversei e aproveitei para planificar o trabalho imediato a fazer na Emissora Regional da Rádio Nacional de Angola (ERH) uma vez ter sido indigitado para assumir a direcção da Emissora. O Filipe, que iria continuar em Benguela (onde os conflitos não afectavam a Rádio), mas, de acordo com o Director Técnico da Rádio Nacional (RNA) Saraiva, iria ao Huambo cumprir um período que permitisse superar algumas situações criadas por pessoas ligadas ao Rádio Clube do Huambo que na hora da retirada haviam sabotado.

Apesar deste post ser motivado pela morte do meu amigo Filipe, a cronologia dos factos que me colocaram esse saudoso amigo a meu lado, absorvem-me acontecimentos paralelos da revolução angolana, que eu aproveito para referir e historiar. Serão longos os textos... é certo, mas penso que poderão, ainda, ter alguma utilidade para além de me permitirem descarregar a minha super lotada camioneta.

Continuarei amanhã. Até lá.


Trabalhei no Rádio Clube de Benguela (1949) neste mesmo edificio que a imagem (2001) mostra, jácomo Emissora Regional. Ali gatinhei como relator desportivo, aprendendo com o Fernando Amaral e o Zeca Santos. Ali passei belos momentos de caradagem com os colegas e amigos e não esqueço o Camonino (Luís Camões) fotógrafo e o Miau, do Portugal de Benguela. Momentos felizes que um dia aqui contarei.


A "NOVA YORK" estabelcimento destacado pela sua enorme gama de produtos, era visitado pelas senhoras chiques da cidade de Nova Lisboa e de muitas outras de cidades de Angola que ali se deslocavam para fazer suas compras e consultar Madame Roseiló, da Stendhal. A UNITA, na enfeitiçada raiva e descontrolo militar, optava por alvos neutros, com lançamentos de obuses de longa distância pois não se atrevia e enfrentar militarmente as FAPLA (Forças Armadas Populares de Libertação de Angola) do Governo Angolano. Esta foto, prova a afronta feita ao povo e a preferência de destruir pelo prazer de destruir.